Setembro Amarelo: descubra onde encontrar tratamento público no SUS para a Saúde Mental
A RAPS (Rede de Atenção Psicossocial) celebra 20 anos, mas os serviços ainda são desconhecidos. Sistema também sofre com estigma e redução de investimentos
Segundo a organização da campanha Setembro Amarelo, composta pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), no Brasil acontecem cerca de 12 mil suicídios todos os anos, mais de 30 por dia. Desses casos, em média, 96% estão relacionados a transtornos mentais, sendo depressão, transtorno bipolar e abuso de substâncias as três causas mais prevalentes.
O mês marca uma importante virada de chave na organização de debates sobre suicídio e as complexas questões ligadas ao tema, que perpassam também a necessidade de olhares mais atentos à prevenção, promoção e manutenção da saúde mental e a produção de modos de vida mais saudáveis. Para tanto, é preciso entender, na prática, como os serviços de saúde mental estão estruturados e como cada cidadão pode fazer uso deles. Para contextualizar, destaca-se o papel da Reforma Psiquiátrica, que impulsionou enormes avanços e transformações no modelo de atenção à saúde mental no Brasil, pavimentando a construção de organismos públicos fundamentais, como a RAPS – Rede de Atenção Psicossocial – que está presente em várias partes do país com uma rede inteligente de acolhimento e atendimentos.
Mecanismos de atendimento público em saúde mental são bastante avançados, mas ainda não amplamente conhecidos
Compreendida como uma rede integrada de diferentes setores e atores, a RAPS busca criar, diversificar e articular serviços e ações para pessoas com sofrimento mental ou com demandas decorrentes do uso de drogas. Dentre suas diretrizes estão o respeito aos direitos humanos, a garantia de autonomia das pessoas, o acesso a serviços de qualidade e o combate ao estigma e ao preconceito.
O serviço conta com atuação multiprofissional e interdisciplinar (com profissionais da medicina, enfermagem, psicologia, assistência social, terapia ocupacional, educação física, fonoaudiologia), abarcando não só o campo da saúde, mas também a assistência social, a cultura e o emprego, de modo a favorecer a inclusão social e o exercício da cidadania dos usuários dos serviços e de seus familiares.
Apesar de não ser amplamente conhecida, a RAPS estabelece que a atenção à saúde das pessoas com sofrimento psíquico deve ser realizada em todos os serviços do Sistema Único de Saúde, sem discriminação. Confira os detalhes sobre a sua atuação:
Atenção Básica em Saúde | – Unidade Básica de Saúde- Núcleo de Apoio à Saúde da Família- Consultório na Rua- Centro de Convivência e Cultura |
Atenção Psicossocial Estratégica | – Centros de Atenção Psicossocial – Equipe multiprofissional de atenção especializada em Saúde Mental- Unidades Ambulatoriais Especializadas |
Atenção de Urgência e Emergência | – SAMU 192- Salas de Estabilização- UPA 24 horas e portas hospitalares de atenção à urgência/ pronto socorro |
Atenção Residencial de Caráter Transitório | – Unidades de Acolhimento- Serviço de Atenção em Regime Residencial – CTs |
Atenção Hospitalar | – Enfermaria especializada em Hospitais Gerais- Hospitais Psiquiátricos Especializados- Hospitais-Dia |
Estratégias de Desinstitucionalização | – Serviços Residenciais Terapêuticos- Programa de Volta pra Casa- Programa de Desinstitucionalização (Equipes) |
Estratégias de Reabilitação Psicossocial | – Iniciativas de Geração de Trabalho e Renda- Empreendimentos solidários e Cooperativas Sociais |
A importância dos CAPS
A rede ainda conta com a existência de estruturas de atendimento especializadas, como os CAPS, que promovem trabalhos com focos distintos. No entanto, alguns estigmas e a falta de conhecimento sobre esses organismos dificultam o acesso a tratativas precoces e ajuda qualificada.
Esses serviços estratégicos funcionam com “portas abertas”, ou seja, qualquer pessoa pode ser recebida e avaliada pela equipe de saúde presente, sem a necessidade de um encaminhamento ou agendamento prévio. As ações de cuidado são diversificadas, realizadas em grupo, individualmente, com a família ou na comunidade.
Divididos em diversas modalidades, os CAPS também variam de acordo com o porte dos municípios. Nas grandes cidades e regiões acima de 200 mil habitantes, são previstos CAPS de funcionamento 24h, como os CAPS III voltados para pessoas com sofrimento mental em geral, e os CAPS ad III, destinados principalmente para pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Os CAPSij são direcionados para o público infanto-juvenil e podem ser implantados em municípios e regiões a partir de 70 mil habitantes. Para os municípios de médio porte (a partir de 70 mil habitantes), há os CAPS II e CAPS ad, e para os de pequeno porte (a partir de 15 mil habitantes), os CAPS I (BRASIL, 2011). Mais recentemente, a esta tipificação foi acrescentado o CAPS ad IV, para municípios com população acima de 500 mil habitantes ou nas capitais de estados.
Em 2002, havia 424 CAPS implantados no país, ao final de 2019, chegaram a cerca de 2.669. Uma amplitude de estrutura assistencial que não apenas existe, mas que pode e deve ser acionada por toda e qualquer pessoa que necessite de auxílio. Falar sobre saúde mental pode ser complexo, mas também é necessário e deve ir muito além do mês de setembro e institucionalizar esse debate em todos os espaços e setores sociais.
“Enquanto houver preconceitos e vieses subjetivos não combatidos e desmistificados, o atendimento psicossocial no Brasil será insuficiente e enviesado. Por isso, é importante termos políticas públicas cada vez mais focadas na prevenção de adoecimentos psíquicos e na promoção da saúde mental, tanto individual quanto estruturalmente, assim como o fortalecimento de outras instituições de acolhimento que possam reforçar o olhar intersetorial e abarcar a necessidade que o tema emprega sobre nós”, pontua Maria Fernanda Resende Quartiero, Diretora Presidente do Instituto Cactus.
Para edificar iniciativas de informação sobre saúde mental no país, o levantamento Caminhos em Saúde Mental, conduzido pelo Instituto Cactus, em parceria com o Instituto Veredas, levantou os principais consensos nacionais e internacionais em saúde mental, bem como um resgate histórico do tema no Brasil, e propôs caminhos de atuação, com suas oportunidades e desafios. O intuito é fortalecer a conscientização coletiva da sociedade e individual sobre a temática e qualificar as discussões.